ESPAÇO TERAPÊUTICO AMOR, SAÚDE E VIDA
Espaço
cultural dedicado às pesquisas, estudos e compartilhamento de informações sobre
Psicanálise, Ciência da Homeopatia e Terapias Complementares Integrativas.
PARECER DO CREMERJ SOBRE O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA PSICANÁLISE POR NÃO MÉDICOS
INTERESSADO:
Vários
RELATORES:
Dr. Miguel Chalub
Consº
Paulo Cesar Geraldes
Câmara
Técnica de Saúde Mental do CREMERJ
QUESTÕES
RELATIVAS AO EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA PSICANÁLISE
EMENTA:
Afirma que a Psicanálise é uma atividade assistencial que não é privativa de
uma determinada profissão. Sua prática deve se orientar pelas determinações das
diversas instituições responsáveis pela formação psicanalítica dos postulantes
que a elas se filiarem. Recomenda que a Psicanálise não deva ser regulamentada
pelo poder público, deixando às diferentes sociedades ou associações o papel de
estabelecer os critérios que considerem adequados para o exercício da
atividade.
CONSULTA:
Consulta solicitada por vários indagando sobre o posicionamento do CREMERJ a
respeito do exercício profissional da Psicanálise.
PARECER:
O exercício profissional da Psicanálise está a exigir definições objetivas e
respostas a diversas questões que frequentemente são formuladas e que até o
momento não foram devidamente equacionadas. Podemos sistematizar estas questões
nos seguintes tópicos:
1-Comporta a Psicanálise um exercício
profissional e, caso comporte, é ela uma atividade assistencial"
2-O exercício da Psicanálise é privativo de
alguma profissão já estabelecida ou regulamentada, ou é a Psicanálise uma nova
profissão específica"
3-Quais as condições para a prática da
Psicanálise, incluindo-se aí as regras da chamada formação psicanalítica"
4-A Psicanálise deve ser regulamentada pelo
Poder Público ou deve ser deixada ao arbítrio de sociedades profissionais"
Sem
entrar em temas históricos e doutrinários, podemos considerar que a Psicanálise
comporta uma atividade assistencial, ou seja, a teoria e a técnica
psicanalíticas podem ser usadas para a compreensão e a solução de problemas
pessoais de natureza psíquica. Queremos como isto dizer que atualmente é
consensual que uma pessoa que apresente sofrimento, questões, queixas ou problemas
psíquicos possa procurar uma outra pessoa que se apresente como sendo capaz de
ajudá-la a encontrar possíveis soluções para suas dificuldades anímicas. Se,
para tanto, são utilizadas a teoria e a técnica psicanalíticas, estaremos
diante da Psicanálise usada como atividade assistencial, por vezes chamada de
Psicanálise Clínica. Cremos que, quanto a este aspecto, não há maiores
divergências.
Por
razões históricas ligadas à sua origem, mas também por motivação ideológica, a
Psicanálise Clínica sempre esteve ligada à Medicina, a mais antiga e mais
conhecida das profissões assistenciais. Destarte, passou a ser considerada uma
das técnicas psicoterápicas a ser praticada por Médicos. Com o surgimento da
Psicologia como profissão assistencial – Psicologia Clínica -, também os Psicólogos, com maior ou menor resistência por parte dos médicos, passaram
também a exercê-la. Hoje em dia, ninguém questiona esta prática. A necessidade
de uma formação específica para este exercício será tratada mais adiante. Pelo
fato de a Psicanálise, além de ser uma atividade assistencial, ser também uma
visão do homem e da cultura permeando todas as produções humanas, em particular
as imaginárias e simbólicas, além das socioeconômicas, passou a interessar aos
cultores das chamadas ciências humanas ou do espírito. Teólogos, Filósofos, Etnólogos, Sociólogos, Pedagogos, Literatos (Romancistas e Poetas) e outros,
desde os primórdios, cultivaram a Psicanálise, mas apenas como pesquisa,
investigação e "weltanschauung" (visão do mundo). Mais tarde, alguns
desses, particularmente os que de certa forma também exerciam atividades
assistenciais, passaram a praticar a Psicanálise Clínica.
Assim,
sacerdotes, assistentes sociais e professores tornaram-se Psicanalistas.
Desde
o início – e Freud, evidentemente, foi o primeiro a levantar a questão -, a
condição indispensável para se tornar um Psicanalista era a análise pessoal e
uma formação teórica específica que, de início, não era muito clara em sua
consistência. A formação universitária era considerada importante, mas não
imprescindível. E esta formação poderia ser em Medicina, Psicologia ou qualquer
outro ramo do conhecimento ainda que não fosse em ciências humanas. Tudo se
passava, usando modelos atuais, como se a formação psicanalítica, em termos de
preparação teórica, fosse uma "pós-graduação", sendo exigida
graduação em qualquer área do saber, mesmo que fosse em ciências exatas ou da
natureza. Daí a questão: o Psicanalista é um profissional independente ou é uma
atividade específica dentro de uma profissão"
Até
hoje não há um consenso nítido se a Psicanálise Clínica deve ser uma profissão
ou uma espécie de especialização de outra profissão. No primeiro caso, haveria,
então, um "curso de graduação" em Psicanálise que seguiria o modelo
tradicional de formação de um profissional da área assistencial: curso teórico
e estágio prático. Caberia, então, incluir obrigatoriamente o requisito da
análise pessoal. No segundo caso, seria um "curso de pós-graduação"
para o qual seria exigida uma graduação em qualquer ramo do conhecimento ou
apenas em determinada área do saber. Uma questão adicional a esta seria
esclarecer se a profissão ou especialização deveria ser regulamentada pelo
Poder Público – como no Brasil ocorre com algumas profissões – ou ser passível
de uma espécie de "regulamentação ética" a cargo de entidades
profissionais.
No
Brasil, não há legislação a respeito do exercício da Psicanálise. Antes mesmo
de se estabelecer regras legais torna-se necessário resolver uma questão
prévia: é uma profissão ou uma especialidade de profissão já
regulamentada" A ninguém ocorre "regulamentar" as profissões de Psiquiatra, Ginecologista ou Ortopedista ou as de Psicólogo Clínico, Psicólogo
do Trabalho ou Psicólogo Escolar pois é amplamente sabido que tais áreas de
conhecimento e prática assistencial não são profissões, mas sim especialidades
de uma atividade profissional, a Medicina ou a Psicologia, estas sim
regulamentadas. Os Conselhos Federais de Medicina e de Psicologia já baixaram
resoluções em que são listadas especialidades por eles reconhecidas, listas
estas que são periodicamente revistas conforme a evolução técnico-científica.
São três os caminhos que se delineiam de acordo com este pensamento:
1-Não regulamentar e deixar que cada um se
intitule Psicanalista conforme seus próprios critérios de formação. É o que
ocorre com muitas profissões, para as quais não há curso superior ou mesmo
técnico.
2-Regulamentar a profissão de Psicanalista
estabelecendo critérios e parâmetros para sua formação, bem como estatuindo as
normas de seu exercício.
3-Os Conselhos Federais de Medicina e de
Psicologia incluírem a Psicanálise nas respectivas listas de especialidades.
Outros conselhos profissionais poderiam também adotar esta medida, como, por
exemplo, o Conselho Federal de Assistentes Sociais. Duas questões devem ficar
bem esclarecidas: o que se regulamenta, seja profissão ou especialidade, é o
exercício assistencial, o atendimento pessoal em Psicanálise, a Psicanálise
Clínica. No caso de regulamentação de especialidade por conselho profissional,
seria inevitável o confronto jurídico, eis que os conselhos não elaboram leis
ou decretos de obrigação geral.
POR
FIM, A ATUAL SITUAÇÃO NO BRASIL
A
Constituição Federal, no item XIII do artigo 5º, assegura liberdade de
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer. No item II do artigo 206, determina a
liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o
saber. Por sua vez, a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Darcy Ribeiro) estabelece que o
ensino é livre à iniciativa privada, desde que atendidas determinadas
condições: cumprimento de normas gerais da educação nacional e do respectivo
sistema de ensino, autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo
poder público e capacidade de autofinanciamento. Em seu artigo 44, a Lei reza
que a educação superior abrangerá, entre outros cursos e programas, os cursos sequenciais
e os de extensão, ambos abertos a candidatos que atendam aos requisitos
estabelecidos pelas instituições de ensino.
Como
antes fora dito, não existe diploma legal, no Brasil, que discipline o ensino e
o exercício da Psicanálise. O único ato normativo baixado até hoje é o Aviso
Ministerial n. 257, de 06/06/1957, do Ministério da Saúde, que especificou
algumas normas sobre a matéria. Assim: admite a existência de Psicanalistas
leigos (não médicos), mas exige uma formação psicanalítica reconhecida pela
Associação Psicanalítica Internacional; as instituições psicanalíticas deveriam
ser credenciadas pela Associação Psicanalítica Internacional; os clientes
destes psicanalistas deveriam ter indicação escrita de um médico que por eles
ficaria responsável. Este documento está eivado de irregularidades e
imprecisões, a saber:
1 - Um ato ministerial não tem competência
constitucional para dispor sobre exercício de profissão;
2 - Subordina instituições brasileiras e
uma formação profissional a ser exercida em território nacional a uma entidade
estrangeira de direito privado e, portanto, sem nenhuma eficácia legal no país;
3 - Não diz em que consiste esta formação
psicanalítica leiga;
4 - Subordina tais profissionais aos Médicos,
mas não especifica como isto se dará e como os médicos poderão ser responsáveis
por pacientes que não serão seus.
DE
TODO O EXPOSTO, CONCLUÍMOS:
1 - A Psicanálise é uma atividade
assistencial;
2 - A Psicanálise, por ser atividade
assistencial, ao ser exercida por médico, passa a se constituir em ato médico,
independentemente da modalidade psicanalítica adotada;
3 - O exercício da Psicanálise não é
privativo de uma determinada profissão e também não é uma nova profissão;
4 - A prática da Psicanálise tem como
requisitos aqueles determinados pela instituição que formulou aquela formação
psicanalítica específica, isto é,
5 - Parâmetros definidos pela escola ou
linha psicanalítica adotada pelo profissional.
6 - A Psicanálise, portanto, não deve ser regulamentada pelo poder público, cabendo às diversas sociedades ou associações psicanalíticas estabelecer os
6 - A Psicanálise, portanto, não deve ser regulamentada pelo poder público, cabendo às diversas sociedades ou associações psicanalíticas estabelecer os
7 - Requisitos que considerarem adequados
para o exercício da modalidade assistencial.
Assim
sendo, infere-se que:
1 - Qualquer entidade pode instituir um
curso de Psicanálise desde que obedecidas a legislação sobre pessoas jurídicas
e as normas do respectivo sistema de ensino;
2 - Qualquer pessoa pode se intitular Psicanalista e exercer esta atividade, respondendo pela falta de limites de sua
prática;
3 - Recomenda-se que o Psicanalista
esclareça a clientela sobre as circunstâncias relativas à sua prática, isto é,
formação psicanalítica, escola psicanalítica a que se filia, mecanismos
inerentes à sua prática psicanalítica, processo e condições de sua atividade
psicanalítica, etc...
Aprovado
em Sessão Plenária de 24/03/2000.
(http://www.portalmedico.org.br/pareceres/crmrj/pareceres/2000/84_2000.htm)
____________________________________________
O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE
PSICANALISTA
Quando uma pessoa
começa a pesquisar sobre a profissão de Psicanalista, acaba se fazendo a
seguinte pergunta: quem pode exercer a profissão de Psicanalista? Como se
tornar um Psicanalista? Psicanalista é o mesmo que Psicólogo?
Essas perguntas são
muito frequentes quando você deseja procurar uma ajuda Psicanalítica, ou até
mesmo tornar-se um profissional dessa área.
PSICANALISTA COMO
PROFISSÃO LIVRE NO BRASIL
Segundo a Constituição
Federal (art. 153, § 23), “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou
profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer.”.
Sobre a liberdade de trabalho,
temos: “Direito consagrado (§ 23º do artigo 153 da Constituição de 1969) razão
pela qual, não consta da nova Constituição, no texto, introdução ou novidade do
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão”.
Assim, os textos
constitucionais demonstram de maneira clara a liberdade sobre qualquer trabalho
ou profissão, ao mesmo que proíbe o Poder Público de determinar normas ou
critérios que possam dificultar qualquer tipo de exercício.
A Psicanálise é
classificada como ciência laica ou leiga e, que por não ter relação com
religiões, pode ser exercida por agnósticos e crentes. Para o termo, laica ou
leiga aponta que a Psicanálise não é relacionada à área médica.
AMPARO LEGAL AO
PSICANALISTA
No mundo inteiro,
inclusive no Brasil, a profissão de Psicanalista é exercida de modo livre (sem
regulamentação), seguindo critérios éticos bem rígidos. Em nosso país, a
profissão se dá segundo o artigo 5. º, incisos II e XIII da Constituição
Federal.
Já, de acordo com o CBO
nº. 2515-50 (ocupação) do Ministério do Trabalho, a atividade de Psicanalista
não se trata de uma especialização, sendo uma formação que acompanha princípios
e procedimentos definidos por suas instituições formadoras. Assim, o Psicanalista pode ter formações em 3º grau ou graduação em diferentes áreas de
atuação.
A PSICANÁLISE NÃO É
EXCLUSIVA DO MÉDICO OU PSICÓLOGO
A profissão de
Psicanálise não é caracterizada como um exercício de Medicina. Assim, a
titulação médico-psicanalista é errada e não permitida. Consultado, o Conselho
Federal de Medicina aponta com objetividade e clareza sobre o assunto:
“A
atividade psicanalítica é independente de cursos regulares acadêmicos, sendo os
seus profissionais formados pelas sociedades psicanalíticas e analistas
didatas”;
“Não
sendo a Psicanálise reconhecida como especialidade médica e não utilizando a
sua prática atos médicos são cabíveis a sua caracterização como exercício da
Medicina e, tampouco, pode o Médico intitular-se Médico Psicanalista”.
O Conselho Regional de
Psicologia do Estado de São Paulo também aponta sobre a relação da Psicanálise
com a Psicologia:
“A
Psicanálise é uma modalidade de atendimento terapêutico, que é exercida por
profissionais Psicólogos, Psiquiatras e outros que recebem formação específica
das Sociedades de Psicanálise ou cursos de especialização neste sentido”;
“Como atividade autônoma não é profissão regulamentada. O Conselho Regional de
Psicologia tem competência para fiscalizar o exercício profissional do Psicólogo, incluindo-se no caso a prática da Psicanálise. Se o profissional que
se diz Psicanalista não é Psicólogo registrado no CRP-SP não temos competência
para exercer a fiscalização”.
SOBRE O EXERCÍCIO
PROFISSIONAL DA PSICANÁLISE
O parecer CREMERJ Nº
84/00 aponta que a Psicanálise é uma atividade assistencial, não sendo
privativa de uma profissão em específico. Quando exercida, deve seguir as
orientações apontadas pelas instituições responsáveis pela formação. Além
disso, nele é recomendado que a Psicanálise não deve ser regulamentada pelo
poder público. Assim, cabe às sociedades e associações definam seus critérios e
códigos adequadas para seu exercício.
Por ser considerada uma
ocupação, e não profissão, a profissão de Psicanalista pode ser exercida por
qualquer pessoa com curso de qualquer tipo de graduação.
Assim, não é
obrigatório ter formação em Medicina ou Psicologia, embora seja comum que
profissionais dessas áreas complementam seus estudos com o método
psicanalítico.
A definição de não ser
uma profissão foi estabelecida por meio da Portaria nº 397, de 09/10/2002, do
Ministério do Trabalho e Emprego do Brasil, que identifica e classifica
inúmeras atividades de trabalho em todas as áreas, sendo nela,
Psicanalista/analista apontada com o código 2515-50.
Vale ressaltar que
ocupação é considerada como um trabalho usual do indivíduo, ainda mais quando
ela o sustenta.
As ocupações seguem
princípios e normas do Ministério do Trabalho e Emprego. Deste modo, está
associada à prática e a uma atividade de trabalho e fonte de renda.
(https://www.psicanaliseclinica.com/quem-pode-exercer-profissao-de-psicanalista/)
_____________________________________________
_____________________________________________
DECISÃO
DA JUSTIÇA FEDERAL
O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA HOMEOPATIA POR TERAPEUTAS HOMEOPATAS NÃO MÉDICOS
O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA HOMEOPATIA POR TERAPEUTAS HOMEOPATAS NÃO MÉDICOS
A
justiça decide: A Ciência da Homeopatia não é exclusiva dos Médicos. Cursos de Homeopatia da UFV são legais.
Resumo
da decisão da Procuradoria da República, válida em todo o território nacional
PRIMEIRA
DECISÃO e CONCLUSÃO
A
HOMEOPATIA NÃO É UMA PRÁTICA EXCLUSIVA DOS MÉDICOS
“…Portanto,
tendo em vista os ensinamentos do mestre Friedrich Müller, a Homeopatia não faz
parte da área da norma subjacente ao programa do preceito constitucional que
estabelece a limitação ao exercício profissional da medicina, não procedendo a
alegação do Conselho Federal de Medicina de que a Homeopatia é prática médica
exclusiva.”
SEGUNDA
DECISÃO E CONCLUSÃO:
AS
UNIVERSIDADES BRASILEIRAS SÃO AUTÔNOMAS PARA ENSINAR CONFORME O ARTIGO 207 DA
CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA
“Por
fim, a alegação da Associação Médica Homeopática Brasileira de que o curso de
extensão em Homeopatia ofertado pela Universidade Federal de Viçosa (UFV)
apresenta irregularidades concernentes ao seu conteúdo, tais como o conteúdo
programático do curso, a carga horária o assunto proposto etc. não podem ser
objeto de atuação deste Parquet pois constitui área abrangida pela autonomia
didática universitária, consagrada pelo art. 207 da Constituição da República.”
A
seguir integra da decisão do:
MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS
PAC
Nº.: 1.22.000.00422212002-59
REPRESENTANTE:
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA – CFM
REPRESENTADA:
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA E OUTROS
DECISÃO
CAPÍTULO
XXV
A
justiça decide: Cursos de homeopatia da UFV
são
legais. A Ciência da homeopatia não é exclusiva dos Médicos
MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS
PAC
Nº.: 1.22.000.00422212002-59
REPRESENTANTE:
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA – CFM
REPRESENTADA:
UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA E OUTROS
DECISÃO
A
DENÚNCIA DO CFM E AMHB CONTRA A UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA E CONTRA A
ATENEMG
Trata-se
de Procedimento Administrativo Cível instaurado contra a Universidade Federal
de Viçosa (UFV) e a Associação de Terapeutas Energéticos e Naturistas do Estado
de Minas Gerais (ATENEMG) em função de representação proveniente do CFM –
Conselho Federal de Medicina (fls. 02/09).
Noticiou-se
que as Representadas estariam atuando em sentido contrário ao regular exercício
da medicina em virtude da divulgação, promoção e patrocínio de cursos de
Homeopatia destinados ao público em geral.
Assim,
conforme se depreende das informações fornecidas pela Associação Médica
Homeopática Brasileira (AMHB), a Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da
Universidade Federal de Viçosa – UFV, em parceria com a ATENEMG, estaria
divulgando Cursos de Extensão de Homeopatia. Todavia, segundo a AMHB, esses cursos
de extensão apresentam inúmeras irregularidades, dentre as quais:
–
O curso no seu modelo atual se adequa melhor a um curso seqüencial de acordo
com o próprio Regulamento da UFV;
–
A exorbitante carga horária (chega a ser 600 horas) proposta para um curso que
se propõe a transmitir generalidades do conhecimento, extrapolando inclusive a
carga horária de cursos de extensão para agentes formadores;
–
inadequação do conteúdo proposto pela Universidade Federal de Viçosa, que
contribui notadamente para formação de profissionais da agropecuária, e o
público-alvo às justificativas que fundamentam a inserção da disciplina de
Homeopatia no contexto da universidade – isto é, o enfoque ao invés de ser o
produtor rural e/ou a produção de alimentos, é a primazia da abordagem clínica
e a divulgação urbana;
–
Conteúdo programático que excede ao objetivo proposto de caráter informativo,
carente de qualquer assunto que vincule a Homeopatia como terapêutica
agronômica; e,
–
Predomínio de assuntos concernentes à saúde humana enfocando a observação
clínica e a abordagem médica e terapêutica.
A
VISÃO DO CFM SOBRE A HOMEOPATIA
De
acordo com o entendimento do CFM, tais irregularidades são decorrentes do fato
de que “a homeopatia é um ato médico e uma especialidade médica, somente
podendo ser praticada por profissional médico devidamente habilitado, em termos
legais e curriculares”. Assim sendo, apenas médicos regularmente inscritos nos
Conselhos regionais de medicina poderiam lecionar e aplicar as técnicas da
Homeopatia.
BASE
LEGAL DA VISÃO DO CFM E PROPOSTA PARA SUSPENSÃO DO CURSO DE EXTENSAO DE
HOMEOPATIA
da UFV
Esse
entendimento decorre do disposto na Resolução nº. 1.627/2001, que define o ato
médico como todo o procedimento que vise: 1) a promoção da saúde e a prevenção
da ocorrência de enfermidades ou profilaxia (prevenção primária); 2) a
prevenção da evolução de enfermidades ou execução de procedimentos diagnósticos
ou terapêuticos (prevenção secundária); e, 3) a prevenção da invalidez ou
reabilitação dos enfermos (prevenção terciária).
Nesse
mesmo sentido, a Resolução n°. 1.634/2002 do CFM definiu expressamente a
Homeopatia como uma especialidade médica e, portanto, somente por médico
regularmente inscrito nos conselhos de medicina pode ser legalmente praticada.
Por
fim, conclui o CFM que “diante de tudo o que foi acima exposto e da conclusão
inequívoca de que a homeopatia é uma especialidade médica e, por conseguinte um
ato médico, solicitamos a essa Douta Procuradoria do Ministério Público Federal
que tome as previdências competentes quanto às irregularidades apontadas no
sentido de suspender os cursos ministrados pela Universidade Federal de
Viçosa”.
PROCESSO
SEMELHANTE APRESENTADO PELO CFM
Tendo
em vista a decisão exarada no PAC n°. 1.22.000.000615/2002-93, que conclui pela
atuação do Ministério Público Federal apenas na esfera cível, e sendo absoluta
a identidade da matéria versada nestes autos como o objeto do PAC n°.
1.22.000.000615/2002-93, determinou-se o arquivamento deste PAC,
centralizando-se as investigações no presente PAC de nº.
1.22.000.004222/2002-59, juntando cópia integral do PAC arquivado e fazendo
constar como requerente, ao lado do Conselho Federal de Medicina, a Associação
Médica Homeopática Brasileira – AMHB.
A
VISÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
SOBRE
A HOMEOPATIA
Destarte,
através do ofício n.° 372/2003 PRM SOTC FAM, requisitou-se à Universidade
Federal de Viçosa que se manifestasse acerca dos fatos relatados pelos
representantes. Em 24 de outubro de 2003, a UFV remete sua resposta ao MPF
afirmando que “a conclusão de que a homeopatia se reduz a ‘especialidade
médica’ está equivocada, por conseguinte não é apenas ato médico. Os equívocos
trouxeram à tona no CFM a hipótese de irregularidade do ‘Curso de Extensão’
promovido pela UFV”.
ATOS
DO CFM SÓ VALEM PARA OS MÉDICOS
Consoante
entendimento da UFV, os atos regulamentares do CFM sobre a prática da
homeopatia (terapêutica humana) aplicam-se somente aos médicos, não sendo
válida aos demais profissionais (veterinário, agrônomo etc.) e à população em
geral.
A
HISTÓRIA DA HOMEOPATIA E O POVO BRASILEIRO
Continua
a Universidade ponderando que não compete ao CFM revogar as atividades da
cultura, nem as tradições da homeopatia preservadas desde 1840 no Brasil e
muito menos os conhecimentos da etnociência brasileira, pois a homeopatia
quando chegou ao Brasil foi aceita e praticada pelo povo e não pelos médicos
que a perseguiram até 1980.
A
CIÊNCIA DA HOMEOPATIA ABRANGE VÁRIAS ÁREAS DO CAMPO DO CONHECIMENTO HUMANO
Defende
que a Homeopatia é também o campo de ação de inúmeras áreas do conhecimento
humano, dentre as quais a Veterinária, Odontologia, Farmácia, Agronomia, Zootecnia,
Biologia, Psicologia etc. Assim, “as pessoas podem praticar homeopatia como
sempre fizeram, desde que não seja como profissionais médicos”, pois “receitar
na condição de médico não é permitido, recomendar na condição de Terapeuta não
é proibido”.
PROVAS
DE QUE A HOMEOPATIA ABRANGE PROFISSÕES COMO A AGRONOMIA
A
fim de comprovar o alegado, juntou-se cópia de estudo publicado pelo Prof.
Marcus Zulian Teixeira que trata da utilização da homeopatia na agricultura
(fls. 84/85 do presente PAC).
Nesse
diapasão, afirma a UFV que “o produtor rural brasileiro escolhe, prepara e
aplica homeopatias visando gerar o alimento sem agrotóxico beneficiando a saúde
da humanidade”, sendo tal prática reconhecida e recomendada pela Instrução
Normativa n.° 7 do Ministério da Agricultura, publicada no Diário Oficial da
União em 19/05/1999, implicando, com isso, que a Homeopatia é livre e não se
limita aos médicos como vulgarmente se crê.
O
CURSO DE EXTENSÃO DE HOMEOPATIA DA UFV TEM APORTE LEGAL NO ART. 43 DA LEI DE
DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO
Relativamente
ao Curso de Extensão em Homeopatia oferecido pela instituição de ensino,
sustenta a UFV que tal curso tem base legal no art. 43 da Lei Federal n.°
9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), pois não confere título de
especialização por ser evento de extensão universitária, sendo “aberto à
participação da população” conforme determina a lei mencionada.
Comprova
a alegação supra através de cópia da ficha de inscrição (fls. 158 do presente
PAC) em que fica expressamente consignado que o objetivo do curso de extensão
universitária em Homeopatia é “divulgar o conhecimento sobre a ciência da
homeopatia, não habilitando o exercício profissional”.
Afirma
que a Homeopatia no curso de extensão da UFV é ensinada por não-médicos, por
ser não-médica. É ensinada como ciência, pela generalidade do saber, visto ser
aplicável a todos os sistemas vivos.
Por
fim, sustenta que a homeopatia ministrada na UFV possui o maior programa de
ensino, pesquisa e extensão universitária do Brasil, pois são visualizados o
ser humano, os alimentos, o meio ambiente e a sustentabilidade.
UFV
PREPARA PÓS-GRADUANDO EM HOMEOPATIA NA ÁREA AGRÍCOLA
Em
virtude disso, “a pesquisa sobre Homeopatia na UFV já gerou 8 teses de
pós-graduação abordando a ciência da Homeopatia havendo mais 5 teses em
andamento. A Fundação Banco do Brasil, com base em comissão internacional, já
certificou a homeopatia da UFV como ‘Tecnologia Social’. A Embrapa premiou o
trabalho da UFV em favor do meio ambiente com homeopatia. O CNPq financiou
várias pesquisas da UFV sobre ciência homeopática. A FINEP aprovou o evento de
extensão ‘Seminário Brasileiro sobre Homeopatia na Agropecuária Orgânica’, promovido
pela UFV. Instituições diversas fazem parceria com a UFV nos eventos de
extensão envolvendo homeopatia”.
O
ESTUDO DO TEMA PELO PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA
É
o relatório. Passo a decidir.
Da
análise do PAC em epígrafe, nota-se que duas questões fundamentais devem ser
enfrentadas, quais sejam:
DUAS
QUESTÕES FUNDAMENTAIS AO ANALISAR O PAC
a)
se a prática e o ensino da homeopatia se restringem aos profissionais médicos;
e,
b)
em caso de ser negativa a assertiva anterior, se o curso de extensão em Homeopatia
ofertado pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) apresenta irregularidades
concernentes ao seu conteúdo. Assim sendo, passa-se à análise das questões
suscitadas.
O
ESTUDO SOBRE A QUESTÃO CONSTITUCIONAL A RESPEITO DA LIBERDADE DO EXERCÍCIO DAS
PROFISSÕES
Em
relação à questão de ser a prática e o ensino da homeopatia ofícios exclusivos
de profissionais médicos, tal assertiva deve ser analisada à luz da disciplina
constitucional do exercício da profissão.
A
liberdade de profissão está consagrada em todas as Constituições brasileiras.
Razão há para tanto, visto ser ela não só um direito fundamental em toda parte
reconhecido, como também constituir uma das peças fundamentais da própria
organização econômica.
Não
foge à regra a Constituição em vigor, de 5 de outubro de 1988.
No
art. 5.°, inciso XIII é esse direito explicitado, nos seguintes termos:
“É
livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
Um
exame perfunctório deste preceito mostra que tal liberdade não é absoluta. Ela
há de ser exercida no contexto da lei, e somente por quem tiver as
qualificações necessárias para tanto.
Na
verdade, no direito contemporâneo, sempre se entende que cada direito
fundamental encontra limites na necessária coordenação para que todos dele
gozem, para a salvaguarda do interesse geral. Nesse sentido Habermas, citando
Kant, diz que “de si mesmo, o direito está ligado à autorização para o uso da coerção;
no entanto esse uso só se justifica quando elimina empecilhos à liberdade,
portanto, quando se opõe a abusos na liberdade de cada um. Essa relação interna
entre o poder geral e recíproco de usar a força e a liberdade de cada um se
manifesta na pretensão de validade do direito”1.
Quando
a Carta Magna admite seja vedado o exercício profissional no caso do indivíduo
não atender as qualificações profissionais exigidas em lei, está ela indicando
que a finalidade das exigências de qualificação visa a garantir a saúde (e a
vida), bem como a segurança de todos e de cada um, que estariam gravemente
ameaçadas se pessoas não preparadas, não habilitadas, não qualificadas,
pudessem exercer profissões delicadas, que concernem à saúde, vida e segurança
individuais.
Não
é de hoje que se enfatiza a necessidade de qualificação adequada para o
exercício de algumas profissões. Analisando a Constituição de 1967, com a
Emenda n.º de 1969, o eminente jurista Pontes de Miranda assinala que “a
liberdade de profissão não pode ir até ao ponto de se permitir que exerçam
algumas profissões pessoas inabilitadas, nem até ao ponto de se abster o Estado
de firmar métodos de seleção” 2.
Continua
o citado mestre discorrendo sobre “pressupostos de capacidade”, onde afirma que
“sempre que a profissão liberal, para que o público seja bem servido e o
interesse coletivo satisfeito, requeira habilitação, não constitui violação à
legislação que estabeleça o mínimo de conhecimentos necessários” 3.
Portanto,
a lei pode estabelecer pressupostos necessários para o exercício das profissões
que demandem um conjunto de conhecimentos necessários e suficientes para que
alguém seja julgado apto à prática de alguma profissão pública ou privada sem
causar prejuízos à vida, saúde e segurança de terceiros.
Assim
sendo, consoante se extrai da dicção do inciso XIII do art. 5.º da Magna Carta,
é constitucional a lei que estabeleça limitações ao exercício de determinadas
profissões, desde que atendidos requisitos materiais e formais.
1
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade, volume 1.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. pág. 49.
2
MIRANDA, Pontes. Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda n.º 1, de
1969 – Volume V. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição, 1971.
pág. 542.
3
Id., ibid., pág. 536/537.
Relativamente
ao requisito material, a limitação ao exercício de determinadas profissões só
se configura constitucional se for determinada por imperativos de qualificações
profissionais que evitem ou diminuam o risco de que a prática dessas profissões
ocasione sérios danos sociais. Assim, para que uma determinada atividade exija
qualificações profissionais para o seu desempenho, é necessário que tal
atividade implique conhecimentos técnicos e científicos avançados, sem os quais
graves danos sociais poderiam ser ocasionados.
Conforme
leciona Celso Ribeiro Bastos, “é lógico que toda profissão implica algum grau
de conhecimento. Mas muitas delas, muito provavelmente a maioria, contentam-se
com um aprendizado mediante algo parecido com um estágio profissional. A
iniciação destas profissões pode-se dar pela assunção de atividades junto às
pessoas que as exercem, as quais, de maneira informal, vão transmitindo os
novos conhecimentos.
Outras
contudo demandam conhecimento anterior de caráter formal em instituições
reconhecidas. As dimensões extremamente agigantadas dos conhecimentos
aprofundados para o exercício de certos misteres, assim como o embasamento
teórico que eles pressupõem, obrigam na verdade a este aprendizado formal” 4.
4
BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988. São Paulo: Editora Saraiva, 1998, pág. 78.
A
LIMITAÇÃO AO EXERCÍCIO DE DETERMINADAS PROFISSÕES SÓ SE CONFIGURA
CONSTITUCIONAL QUANDO FOR DETERMINADA POR LEI FEDERAL
Em
relação ao requisito formal, a limitação ao exercício de determinadas
profissões só se configura constitucional se for determinada por lei federal,
cuidando-se de matéria de estrita reserva legal, ou seja, sem qualquer
possibilidade de outros atos normativos do Legislativo ou Executivo virem a lhe
fazer às vezes, pois ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei (art. 5.°, inciso) II da Constituição da República
de 1988).
In
casu, visando zelar pela saúde humana, portanto, pela própria vida, o exercício
da medicina é obviamente um dos que mais evidentemente exigem qualificação
especial para o seu exercício, sendo inteiramente constitucional lei ordinária
que restrinja o exercício da medicina pela observância de algumas qualificações
profissionais.
O
QUE ESTABELECE A LEI FEDERAL 3.268
QUE
CRIOU O CFM
No
Brasil, a Lei Federal n.° 3.268, de 30 de setembro de 1957, institui um
sistema, encabeçado pelo Conselho Federal de Medicina, respaldado por Conselhos
Regionais, com a incumbência de controlar esse exercício.
Dentre
as atribuições dos Conselhos Regionais salienta-se está a de verificar a
habilitação de quem pretende exercer essa profissão. Para tanto, o art. 17 da
mencionada lei condiciona o exercício da medicina a uma inscrição em Conselho
Regional de Medicina competente. Comprova isto a importância que tem, para a
comunidade, restringir o exercício da medicina apenas aos habilitados por seus
conhecimentos a fazê-lo.
QUAL
É O CAMPO ATUAL QUE É EXCLUSIVO DO MÉDICO E ONDE COMEÇA O CAMPO QUE ABRANGE A
ÁREA DE OUTROS PROFISSIONAIS DA SAÚDE?
RESOLUÇÕES
DO CFM PODEM CONTROLAR A AÇÃO DE NÃO MÉDICOS?
Todavia,
a Lei n.° 3.268/57 não delimitou o campo da profissão de médico; não
estabeleceu a área de atuação exclusiva do profissional médico, onde seria
vedado a qualquer outro profissional atuar de forma lícita.
Ora,
sendo a definição do campo da profissão do médico matéria afeta exclusivamente
a regulamentação legal, imprestável é a definição do que vem a ser ato médico
(Resolução n.° 1.627/01 do CFM) e das especialidades médicas (Resolução n.°
1.634/02 do CFM) por atos normativos do próprio Conselho Federal de Medicina,
pois tais resoluções, não tendo força de lei, não podem obrigar às pessoas a
deixarem de fazer alguma coisa.
Diante
de tal situação, seria lícito afirmar que, na ausência de determinação legal
exigida pelo texto constitucional, não há uma área de atuação exclusiva para o
médico, pois o indivíduo só é obrigado a abster-se de determinado comportamento
em virtude de lei (art. 5º, inciso II da CR/88)? Em sendo verdadeira a
assertiva anterior, qualquer pessoa, independentemente de sua qualificação
profissional, poderia realizar, por exemplo, uma cirurgia neurológica?
Se
são inconstitucionais as resoluções do Conselho Federal de Medicina que se
destinam a delimitar as áreas de atuação exclusivas dos médicos, seria, de
fato, “mais inconstitucional ainda” que, exigida a qualificação médica para
proteger o indivíduo na sua vida e saúde, fosse permitido a qualquer pessoa
independente de sua qualificação profissional realizar uma cirurgia neurológica
em virtude da omissão do Poder Legislativo em editar uma lei que defina qual a
área de atuação exclusiva dos médicos.
TEORIA:
QUANDO AGE A JUSTIÇA NUMA CELEUMA JURÍDICA PARA CONSTRUIR UMA NORMA JURÍDICA
QUE COMPLEMENTA O ESPÍRITO DA CONSTITUIÇÃO, DA LEI E DO FATO SOCIAL
Perante
tal celeuma jurídica, a única alternativa possível para a concretização do
disposto no inciso XIII, do art. 5.º, da Constituição da República de 1988 é
adotar uma postura interpretativa concretista condizente com o paradigma do
Estado Democrático de Direito (art. 1.º da CR/88), em que o texto da
Constituição não encerre toda a normatividade dos fatos sociais, mas que a
norma jurídica que regule os fatos sociais seja construída caso a caso através
da inter-relação entre Texto Constitucional, conhecimento histórico, filosófico
e científico dos diversos subsistemas de saber que compõem o saber humano e a realidade
social circundante.
Nas
palavras do insuperável constitucionalista Paulo Bonavides, “com a
constitucionalidade material o que se busca, num determinado sentido, é
conciliar a realidade com a Constituição, o ser com o dever-ser, a regra com o
princípio, o direito do cidadão com a autoridade do Estado. De tal maneira que
se venham a captar na ordem fática elementos de juridicidade com que erguer a
base normativa de concretização dos preceitos ou comandos a partir da letra do
texto constitucional, combinado a seguir com os aludidos elementos de
facticidade.
Toda
a linha interpretativa mediante a qual se rege a teoria material da
Constituição se coloca, por conseguinte, em polo oposto ao da Hermenêutica
clássica pelo menos numa fase onde a relevância do texto normativo não
concentra nem monopoliza os subsídios ou elementos de compreensão que perfazem
a trajetória concretizante de aplicação da norma” 5.
5
BONAVIDES, Paulo. Reflexões: Política e Direito. São Paulo: Editora Malheiros,
3ª edição, 1998. pág. 27.
Destarte,
consoante ensinamento do constitucionalista alemão Friedrich Müller, “a norma
jurídica que disciplina um fato social é mais que o seu teor literal. O teor
literal expressa, juntamente com todos os recursos interpretativos auxiliares,
o ‘programa da norma’. A área da norma pertence à norma com grau hierárquico
igual. Ela é a estrutura básica do segmento da realidade social, que o programa
da norma ‘escolheu para si’ como a ‘sua’ área de regulamentação (…)” 6.
6
MULLER, Friedrich. Direito, Linguagem, Violência – Elementos de uma teoria
constitucional. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1995. pág. 42/43.
TEORIA
DO DIREITO E APLICAÇÃO DA SUA PRÁTICA
No
caso em epígrafe, deve-se, portanto, descobrir qual é a área da norma do
preceito constitucional que limita a liberdade do exercício profissional à
necessidade de qualificação profissional, ou seja, deve-se descobrir se a
prática e ensino da Homeopatia estão abrangidas pela área de atuação exclusiva
dos profissionais médicos. Tal descoberta só será possível através da captação
na realidade social de elementos de juridicidade que determinem o sentido do
texto constitucional.
Assim
sendo, a norma jurídica possui uma estrutura ambígua, pois, de um lado,
aguarda-se que o endereçado da norma interprete o conteúdo da mesma, e, de
outro, que se submeta a tal norma, dando seu aval difuso. Nas palavras do
inigualável jurista Tércio Sampaio de Ferraz Júnior, “está aí o comportamento
ambíguo que nos leva à ambiguidade estrutural do discurso normativo. O
endereçado é, ao mesmo tempo, convidado a participar, co-determinando o sentido
do relato (conteúdo da norma), e convidado apenas a submeter-se” 7.
7
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Teoria da Norma Jurídica. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2003. pág. 45.
Esta
ambiguidade de comportamento do jurista que interpreta o texto normativo faz do
discurso normativo uma ação linguística sui generis, que, estruturalmente, é,
ao mesmo tempo, dialógica e monológica. É dialógica quando o conteúdo normativo
(sentido da norma jurídica) é relevante e os juristas aparecem como parte
argumentante e intérprete. É monológica quando o conteúdo normativo é
secundário e os comunicadores aparecem como autoridade e sujeito.
Neste
diapasão, conclui o mencionado jurista que “se o discurso normativo é, pois,
dialógico e monológico, disto decorre que o objeto do discurso, conforme o
modelo pragmático, a questão (quaestio), é também, ao mesmo tempo, um certum e
um dubium. É um certum, tendo em vista a relação autoridade/sujeito, de
estrutura monológica, cuja regra básica diz que nem todas as ações linguísticas
do orador podem ser postas em dúvida pelo ouvinte (intérprete) (…). É um dubium,
tendo em vista a relação parte argumentante/intérprete, de estrutura dialógica,
cuja regra básica diz que todas as ações linguísticas do orador (norma) podem
ser postas em dúvida pelo ouvinte (intérprete), donde a necessidade de diálogos
parciais para obtenção de enunciados primários, de força persuasiva, a partir
dos quais o diálogo decorre” 8.
8
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Teoria da Norma Jurídica. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2003. pág. 47.
A
POSTURA INTERPRETATIVA CONCRETISTA QUE COADUNADA AO TEXTO CONSTITUCIONAL, À LEI
E AO FATO SOCIAL
Assim,
a necessidade de se adotar uma postura interpretativa concretista que coadune
texto constitucional, subsistemas de saberes sociais e realidade social decorre
do fato da fragmentação da sociedade em sistemas parciais autônomos, os quais
conduzem os seus respectivos discursos e que têm que arranjar-se com
construções próprias da realidade, incompatíveis entre si.
Destarte,
o direito, a Medicina, a Agronomia etc., como sistemas parciais autônomos,
interpretam diferentemente uma mesma realidade (por exemplo, a ciência da
Homeopatia), atribuindo a uma mesma realidade conotações diversas. Todavia,
esses sistemas parciais autônomos (direito, medicina e agronomia, por exemplo)
utilizam um medium comunicacional geral para formular seus discursos
explicadores de uma determinada realidade, permitindo, desta forma, que tais
sistemas parciais entrem em contato uns com outros, influenciando a formulação
de cada um dos discursos parciais.
Desta
maneira, a linguagem, que circula em todos os sistemas parciais autônomos,
permite o engate comunicativo de todos os sistemas parciais com a realidade,
possibilitando que os códigos especializados de cada subsistema (do direito,
medicina, agronomia etc.) opere funcionalmente na realidade social. Afirma
Habermas que “a linguagem coloquial, gramaticalmente complexa e estruturada
reflexivamente, possui, do mesmo modo que a mão, que constitui um monopólio
antropológico, a vantagem da multifuncionalidade. Com sua capacidade de interpretação
praticamente ilimitada e com seu modo de circulação, é superior aos códigos
especiais pelo fato de formar um campo de ressonância para os ônus externos dos
sistemas parciais diferenciados, permanecendo, deste modo, sensível aos
problemas da sociedade global” 9.
9
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade, volume I.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. pág. 81.
Especificamente
em relação ao direito, observa o jusfilósofo Jürgen Habermas que “todo o ato
jurídico é, uno actu, um evento da comunicação social geral. O mesmo evento
comunicativo está engatado em dois discursos sociais distintos, ou seja, no
discurso jurídico especializado, institucionalizado, e numa comunicação geral
difusa. A interferência do direito com outros discursos sociais não significa
que estes se diluam num superdiscurso multidimensional e também não significa
que haja uma ‘troca’ de informações entre eles. Pois, em cada discurso, a
informação é constituída de modo novo, e a interferência não acrescenta ao todo
nada além da simultaneidade de dois eventos comunicativos” 10.
10
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade, volume I.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. pág. 79.
Exemplo
da função de interligação dos sistemas parciais realizada pela linguagem é um
contrato de arrendamento, pelo qual o ato jurídico cruza-se com uma transação
econômica e com fenômenos da realidade social dos participantes.
TEORIA
DO DIREITO POSITIVO PARA SE DETERMINAR SE A CIÊNCIA DA HOMEOPATIA É UMA PRÁTICA
EXCLUSIVA MÉDICA
No
caso em questão, deve-se, utilizando o direito positivo como uma espécie de
rede geral de comunicação socialmente integradora dos diversos sistemas
parciais, analisar os discursos disciplinadores do saber médico e demais
saberes sociais a fim de determinar se a ciência da Homeopatia é uma prática
exclusiva médica.
Conforme
demonstrado no presente PAC, a Homeopatia é campo de ação de inúmeras áreas do
conhecimento humano, dentre as quais a veterinária, odontologia, farmácia,
agronomia, zootecnia, biologia, psicologia etc., pois se trata de um sistema de
saber que visa estudar o modo de ser de todos os sistemas vivos, podendo seus
conhecimentos ser usados tanto no objetivo de prevenção e cura de algumas
patologias humanas (ciência médica) quanto no objetivo de aplicar seus
conhecimentos aos demais seres vivos (biologia), no fomento da atividade
agrária (agronomia) etc.
Tanto
isso é verdade que, aplicando seu discurso cognitivo à agronomia, por exemplo,
a Homeopatia visa gerar o alimento sem agrotóxico, beneficiando a saúde da
humanidade, sendo tal prática reconhecida e recomendada pela Instrução
Normativa n.° 7 do Ministério da Agricultura, publicada no Diário Oficial da
União em 19/05/1999.
CONCLUSÃO
DO PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA:
PRIMEIRA
DECISÃO E CONCLUSÃO
A
HOMEOPATIA NÃO É UMA PRÁTICA
EXCLUSIVA
DOS MÉDICOS
Portanto,
tendo em vista os ensinamentos do mestre Friedrich Müller, a Homeopatia não faz
parte da área da norma subjacente ao programa do preceito constitucional que
estabelece a limitação ao exercício profissional da medicina, não procedendo a
alegação do Conselho Federal de Medicina de que a Homeopatia é prática médica
exclusiva.
SEGUNDA
DECISÃO E CONCLUSÃO:
AS
UNIVERSIDADES BRASILEIRAS SÃO AUTÔNOMAS PARA ENSINAR CONFORME O ARTIGO 207 DA
CONSTITUIÇÃO BRASILIERA
Por
fim, a alegação da Associação Médica Homeopática Brasileira de que o curso de
extensão em Homeopatia ofertado pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) apresenta
irregularidades concernentes ao seu conteúdo, tais como o conteúdo programático
do curso, a carga horária o assunto proposto etc. não podem ser objeto de
atuação deste Parquet pois constitui área abrangida pela autonomia didática
universitária, consagrada pelo art. 207 da Constituição da República.
Diante
do exposto, determino o arquivamento do presente PAC, devendo ser procedidas as
comunicações de estilo.
Belo
Horizonte, 29 de janeiro de 2004.
FERNANDO
DE ALMEIDA MARTINS
Procurador
da República
Auxiliou
na elaboração desta o estagiário Matheus de Mendonça Leite, desta procuradoria.
Para
facilitar ao leitor, todos os títulos dos parágrafos, em caixa alta, foram
formulados por José Alberto Moreno (Geógrafo homeopata, presidente da ATENEMG).
O
texto é a íntegra da decisão do Procurador da República em Minas Gerais sobre o
PAC, Processo de Ação Civil contra a Universidade Federal de Viçosa e a
ATENEMG.
(https://homeopatias.com/duvidas/a-ciencia-da-homeopatia-nao-e-exclusividade-medica-decisao-ministerio-publico-federal/)
JOSUÉ CAMPOS MACEDO
Psicanalista & Terapeuta
Homeopata
(NÃO MÉDICO)
CLASSIFICAÇÃO BRASILEIRA DE OCUPAÇÕES
MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO DO BRASIL,
CBO 2515-50 & CBO 3221-25
"Comece agora o seu Tratamento, e resolva
viver cada dia mais feliz"
"Os mais inestimáveis tesouros são a
consciência irrepreensível e a boa saúde. O
amor a Deus e o estudo de si mesmo oferecem uma; a Homeopatia oferece a outra."
Dr. Samuel Hahnemann